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Processo Sigiloso Expõe Erros e Contradições de Moraes no Uso de Órgão do TSE, diz Folha


Segundo uma nova revelação do jornal Folha de S. Paulo, um processo mantido em sigilo por quase dois anos contra o ex-deputado estadual Homero Marchese, cujas redes sociais foram bloqueadas por ordem do ministro Alexandre de Moraes, revela erros críticos, o uso informal do órgão de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e contradições nas explicações fornecidas pelo próprio ministro após a divulgação das primeiras reportagens sobre o caso.

O caso em questão destaca como um pedido de apuração, feito por Moraes através de seu gabinete, foi oficialmente registrado como uma denúncia “anônima”. Além disso, expõe o modo como o TSE foi utilizado para fornecer material a inquéritos criminais em andamento contra bolsonaristas.

Procurado por meio de sua assessoria e informado sobre o teor da reportagem, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) optou por não se manifestar.

A origem do caso remonta a um sábado, 12 de novembro de 2022, logo após o fim das eleições. Naquela noite, segundo mensagens obtidas pela Folha de S. Paulo, houve uma troca de diálogos via WhatsApp entre o juiz Airton Vieira, braço direito de Moraes no STF, e Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED) do TSE.

Às 22h02 daquele dia, Airton Vieira enviou três arquivos para Tagliaferro, contendo informações sobre manifestações planejadas contra ministros do STF em Nova York, nos dias 14 e 15 de novembro, durante um evento promovido pelo grupo Lide, do ex-governador João Doria. Um dos arquivos era um vídeo que destacava a localização do hotel onde os ministros se hospedariam, acompanhado por dois posts, um com o endereço do hotel e outro com o anúncio do evento junto da frase: “Máfia Brasileira. Eduardo, por favor, consegue identificar? E bloquear? O Ministro pediu… Obrigado”, escreveu Vieira.

Tagliaferro, que estava em trânsito entre São Paulo e Brasília, informou que faria um relatório sobre o caso. No entanto, às 23h09, ele levantou uma preocupação importante: “Só não sei como bloquear pelo TSE pq não fala nada de eleições”, afirmou, destacando que as postagens não estavam diretamente relacionadas ao processo eleitoral. Vieira respondeu no mesmo minuto, evitando a dúvida e questionando se os autores das postagens haviam sido identificados. Tagliaferro conseguiu identificar “apenas um candidato do Paraná”.

Às 23h54, Tagliaferro enviou um relatório a Vieira. Curiosamente, o documento do TSE indicou que o material foi recebido de forma “anônima” e que o relatório foi produzido a pedido de Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes no TSE, embora Vargas estivesse em um voo e não tivesse feito tal solicitação naquele momento.

Ao analisar as postagens, Tagliaferro identificou Homero Marchese, então deputado estadual pelo Republicanos do Paraná, como responsável por uma das imagens, mas o conteúdo postado por Marchese era um panfleto convocando a comunidade brasileira nos EUA para um evento, sem qualquer referência à localização dos ministros. A frase “máfia brasileira” foi adicionada por uma terceira pessoa, ainda não identificada.

Apesar disso, o relatório do TSE indicava que Marchese era o autor da mensagem. Com base nesse relatório, Alexandre de Moraes determinou o bloqueio das contas de Marchese no Twitter, Facebook e Instagram nas primeiras horas do dia 13 de novembro. A decisão foi tomada sem consultar o Ministério Público ou a Polícia Federal.

Na sessão plenária do STF em 14 de agosto, após a publicação das primeiras reportagens da Folha, Moraes declarou que todos os alvos dos relatórios do órgão de combate à desinformação do TSE já estavam sendo investigados nos inquéritos das fake news ou das milícias digitais, ambos sob sua relatoria. Gilmar Mendes, em entrevista à Band, reforçou esse ponto.

Entretanto, a Folha teve acesso ao processo e constatou que Homero Marchese não era alvo das investigações anteriores e que Moraes não levou os recursos apresentados ao plenário do STF.

O processo também revelou que Moraes bloqueou as contas de Marchese com base na identificação equivocada feita por Tagliaferro, acusando o então deputado de divulgar informações pessoais sobre a localização dos ministros, fato que não constava no relatório.

Marchese ficou com o Instagram bloqueado por quase seis meses, além de um mês e meio sem acesso ao Twitter e ao Facebook. A Procuradoria-Geral da República (PGR) só teve acesso ao caso três dias após a decisão de bloqueio, e Marchese, apenas em 1º de dezembro.

Em 21 de novembro, a então vice-procuradora-geral, Lindôra Araújo, entrou com um recurso pedindo a anulação da decisão de Moraes, argumentando que o uso do órgão de combate à desinformação para investigações criminais era ilegal. Moraes não analisou esse recurso e, em 23 de dezembro, desbloqueou as contas de Marchese no Twitter e Facebook, sem avaliar o mérito dos agravos.

O Instagram de Marchese foi reativado em 2 de maio, após decisão da Justiça do Paraná. O ex-deputado só descobriu os motivos do bloqueio 15 dias depois, sem nenhuma explicação oficial.

Este caso exemplifica a complexidade e os potenciais excessos das ações judiciais ligadas ao combate à desinformação, levantando questões sobre o uso de órgãos eleitorais para fins criminais e a transparência nas decisões judiciais.




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