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Decisão nos processos de Lula provoca “efeito dominó” e trava outros processos no STF

“Delação do Fim do Mundo” como se chamou o acordo de leniência da Odecbrecht/Novonor, é o pivô dos despachos de Lewandowski que amplia os efeitos para outros réus


A anulação de parte do acordo de delação premiada da Odebrecht, que hoje se chama Novonor, teve início nos processos da Operação Lava Jato contra o presidente Luíz Inácio Lula da Silva, quando a defesa recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para ter acesso à íntegra dos sistemas eletrônicos da empreiteira, travando, em efeito cascata, uma série de processos na Justiça.

O acordo de colaboração da Odebrecht/Novonor chegou a ser apelidado de “Delação do Fim do Mundo” em razão do possível impacto no cenário político do país à época. Aberto o precedente que beneficiou o agora presidente Lula, os processos judiciais que tiveram os mesmos dados do acordo de leniência, começaram a ser suspensos pelos STF.

Já em dezembro, na ampliação dos efeitos da decisão pró-Lula, foram paralisadas as tramitações das ações que envolviam delatores da empreiteira, contra o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ex-candidato ao Governo de São Paulo, Paulo Skaf (Republicanos).

As defesas de outros investigados na Operação Lava Jato e seus desdobramentos, como o ex-deputado Eduardo Cunha (PTB) e o ex-senador Edison Lobão (MDB) ingressaram com pedidos de extensão da medida que deverá ser analisada pelo ministro Ricardo Lewandowski.

O ponto de inflexão que tem feito os tribunais mudarem de posição refere-se aos sistemas eletrônicos, chamados de Drousys e MyWebDay, usados pela construtora para registrar pagamentos ilícitos e que ficavam armazenados em bancos de dados na Europa. Estas informações são as principais provas de comprovação dos relatos das irregularidades cometidas por 78 executivos da empreiteira em seus depoimentos.

A banca de advogados que atende os processos do presidente Lula, coordenada pelo jurista Cristiano Zanin Martins, afirmou que a Vara Federal de Curitiba cerceava o direito à plena defesa do réu, ao restringir acesso a todos os dados entregues pela empreiteira, e solicitou que o acordo de leniência fosse invalidado.

Os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes determinaram que o acesso integral ao acordo de leniência fosse concedido para a defesa. Em seguida, a defesa de Lula também conseguiu autorização para ter acesso às mensagens trocadas por procuradores quando da Operação Spoofing, que investigou o hackeamento dos telefones de autoridades da Lava Jato. Lewandowski concedeu o acesso, e os advogados de Lula trouxeram para os autos centenas de páginas de transcrições de conversas da força-tarefa feitas no aplicativo Telegram.

O ministro Edson Fachin, que é o relator oficial no STF da Operação Lava Jato, foi voto vencido e em decorrência deste ato processual, o ministro Lewandowski passou a ser o relator do recurso da defesa, chamado de “reclamação”. A defesa, então iniciou uma série de “reclamações” ao STF que passaram a ser analisadas primeiramente por Lewandowski, inclusive, após uma das ações penais abertas contra Lula, já ter sido enviada da Justiça de Curitiba para a do Distrito Federal, também por ordem do Supremo.

Com base nos diálogos dos procuradores, Lewandowski despachou afirmando que os dados eletrônicos da empreiteira tinham sido transportados sem as devidas precauções legais e que as tratativas internacionais para o acordo se deram “à margem da legislação vigente”.

O acordo com a Odebrecht/Novonor tinha sido firmado no fim de 2016 por autoridades do Brasil, da Suíça e dos Estados Unidos, e envolveu o pagamento de multa projetada à época, em R$ 8,5 bilhões. O ministro considerou que a negociação ocorreu de modo informal, sem respeitar exigências de cooperação internacional. Sua decisão foi referendada pelos ministros Gilmar Mendes e Kassio Nunes Marques que integram a Segunda Turma da Corte.

Em decorrência desta decisão, as defesas de outros réus pleitearem a extensão dos seus efeitos. O empresário Walter Faria, dono da cervejaria Petrópolis, também teve seu pedido aceito por Lewandowski, sob o argumento de que a situação dele era idêntica à de Lula, e que a mesma medida deveria ser tomada. Ele responde por ações penais sob a acusação de participar de esquemas ilegais de financiamento de políticos coordenado pela Odebrecht/Novonor.

O mesmo aconteceu com o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, que é réu na Justiça Federal no Rio Grande do Sul, e igualmente teve suspensa a tramitação de ação penal contra ele. Em um efeito dominó, foram paralisadas as ações penais eleitorais contra o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), e o deputado federal Pedro Paulo (PSD-RJ) que tramitavam no Rio.

O ministro Edson Fachin, já em um dos seus votos, no julgamento de fevereiro de 2022, teceu inúmeras críticas ao modo como se deu a tramitação dos pedidos relacionados ao acordo da Odebrecht/Novonor a partir do caso do presidente Lula.

Disse que o único embasamento para declarar a invalidação das provas do acordo de leniência foram as mensagens hackeadas dos procuradores e que a tramitação violou o devido processo legal, quando houve a ampliação dos pedidos das defesas. Também questionou a regularidade da permanência de Lewandowski à frente da análise desses pedidos.

Da mesma forma, a Procuradoria-Geral da República, por meio da subprocuradora Lindôra Araújo, fez questionamentos de igual teor e declarou que “sujeitos totalmente estranhos” ao ponto de partida do procedimento “aventuraram-se para postular e por vezes lograr indevidas extensões de efeitos”.

No documento, o Ministério Público nega que tenha havido irregularidades nas tratativas internacionais da colaboração da Odebrecht/Novonor e diz que as decisões estavam sendo tomadas no STF sem “instrução probatória ou oportunidade para o exercício do contraditório”.

O ministro Lewandowski refuta tais alegações e tem dito, nos seus despachos, que o julgamento sobre a imprestabilidade das provas da empreiteira no caso de Lula, já transitou em julgado, encerrando, assim, a possibilidade de novos recursos e que a decisão da Corte pode, sim, ser estendida.

O magistrado rechaçou nos autos também a afirmação de que tenha havido alargamento indevido dos temas discutidos na reclamação inicialmente protocolada por Lula e disse que o acesso ao acordo de leniência é e sempre foi o objeto do procedimento.

A Novonor/Odebrecht informou que “desde o início, vem colaborando de forma plena com as autoridades em busca do total esclarecimento de fatos do passado e que hoje está inteiramente transformada e usa as mais recomendadas normas de conformidade, seguindo comprometida com uma atuação ética, íntegra e transparente.”

 




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