Brasil será julgado por violações de direitos humanos, caso tramita há mais de 20 anos
O Brasil será julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por possíveis violações de direitos humanos contra as comunidades quilombolas de Alcântara, no Maranhão. O caso está relacionado à instalação do Centro de Lançamento de Alcântara, projeto iniciado pelo governo militar brasileiro, ainda na década de 1970.
A construção da base de lançamentos de foguetes da FAB envolveu a remoção compulsória de mais de 300 famílias ao longo da década de 1980. Mais recentemente, o governo Bolsonaro chegou a assinar acordo para ceder a utilização da base aos Estados Unidos, o que também é questionado pelos quilombolas. Além disso, o processo de titulação do território não avança há mais de 13 anos.
As organizações que peticionaram a denúncia foram comunicadas do envio do caso à Corte IDH na primeira semana de janeiro de 2022, após mais de 20 anos de tramitação no Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos, ligado à OEA (Organização dos Estados Americanos). Entre os mecanismos do Sistema está a análise de violações de direitos humanos cometidas por Estados-membros da OEA. Em geral, os casos surgem a partir de denúncias feitas por pessoas ou entidades não governamentais.
A petição foi apresentada em agosto de 2001 perante a CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) por representantes das comunidades afetadas e entidades como a Justiça Global, a Global Exchange e a FETAEMA (Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Maranhão), entre outras. O texto apontava “desestruturação sociocultural e violação ao direito de propriedade e ao direito à terra” dos quilombolas de Alcântara.
A denúncia foi considerada admissível – ou seja, entendeu-se que ela atendia aos requisitos básicos para ser analisada – pela CIDH em 2006. Depois disso, foram realizadas duas audiências públicas, em 2008 e em 2019, até que a Comissão emitiu um relatório de mérito, em junho de 2020.
REMOÇÃO E FALTA DE TITULAÇÃO ESTÃO ENTRE VIOLAÇÕES ANALISADAS
A principal violação denunciada pelas organizações sociais e representantes locais ao Sistema Interamericano, a remoção de 312 famílias quilombolas para a construção da base de Alcântara ocorreu a partir de 1986, já durante o governo Sarney. Uma das estratégias utilizadas para efetivar a retirada dos moradores foi o treinamento de 30 jovens locais pelas Forças Armadas. Eles foram enviados para São Paulo em 1983 e, posteriormente, voltaram a Alcântara para participar das remoções, segundo uma reportagem da National Geographic.
Os quilombolas removidos foram deslocados para agrovilas planejadas pelos militares, em áreas distantes do litoral e sem que fossem respeitadas as particularidades de cada comunidade. Além disso, a instalação do CLA também vem afetando a subsistência e o modo de vida tradicional das milhares de famílias quilombolas da região. Alcântara, localizada na região metropolitana de São Luís, concentra a maior população quilombola do país, com mais de 17 mil pessoas, distribuídas em quase 200 comunidades.
JUSTIÇA BARROU NOVA REMOÇÃO DE FAMÍLIAS RELACIONADA A ACORDO COM OS EUA
A “cessão da Base Espacial para lançamentos privados”, que Pedrosa menciona, avançou especialmente com a assinatura de um AST (Acordo de Salvaguardas Tecnológicas) com os Estados Unidos, celebrado entre Jair Bolsonaro (PL) e o então presidente norte-americano Donald Trump, em março de 2019, na primeira visita do mandatário brasileiro aos EUA. A tratativa entre os dois países se iniciou ainda no governo de Michel Temer (MDB), em 2017. Segundo estimativas do governo na época da assinatura, o aluguel da base poderia gerar até 10 bilhões de dólares anuais para o Brasil.
A proposta aventada por Temer e concretizada por Bolsonaro reciclou ideia apresentada no início dos anos 2000, ainda no mandato de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), mas que acabou rejeitada pelo Congresso Nacional por acusações de que feriria a soberania nacional. À época, um plebiscito popular, que reuniu mais de 10 milhões de votos, deu indicativo contrário à proposta, contribuindo para a negativa do parlamento. As informações são do Poder360.